quarta-feira, 15 de abril de 2009

Perdido num mundo dele...

Um dia o Sr. A chegou lá ao serviço. Tinha tido um AVC e estava com dificuldades em mexer a parte esquerda do corpo contrariando as estatísticas da ciência. Segundo um vizinho conversava muito bem e era uma pessoa, que apesar dos seus 65, era muito actual e bem disposta. Todos na sua freguesia adoravam o Sr. A. Do que percebemos da sua vida, dava para entender que tinha sido sempre um homem de armas e convicções! Há uns tempos ela, a esposa, também tinha tido um AVC e precisa de ajuda no autocuidado. Ah o Sr. A era quem a ajudava. Desde que ele foi internado, não tem tido muitas visitas! Não é por aconselhamento médico… por que será?

Um dia ele disse-me que estava desejoso de sair, de melhorar, de voltar a andar, nem que fosse com uma bengala... queria ir ao estádio do dragão, porque gostava de ver “o seu FCP”.

Há uns dias o Sr. A foi fazer um exame e as coisas correram mal... ele repetiu o AVC, desta vez de modo gravíssimo... Quando a voltei a ver não se lembrava de mim... parecia que falava com ele e ele estava noutro mundo. Não dizia uma frase correcta... tinha perdas de urina, iria ficar algaliado para sempre. Ah, foi dito à esposa que aquele tubinho que tinha no nariz era para ficar também. Assim como o uso de fralda!

Nem sei expressar o sentimento que tenho ao perceber que o senhor, irreversivelmente, vai viver no mundo dele. Tentei dizer-lhe que tinha ganho o FCP este fim de semana… ele respondeu-me "Já disse que hoje não lavo o carro!".... Ele percebe o que dizemos!

Ele está confuso, agitado, fala fala e não diz nada de jeito. Mal consegue ajudar-nos como antes fazia... Como é que de um momento para o outro deixamos de ser nos mesmos...? Como de um momento para o outro esquecemos todos os objectivos? E perdemo-nos nas memórias? Quem irá tomar conta dele? Ou deles?

Já pensaram se fossemos nós, este Sr. A? Quem daquele que achamos que são nossos amigos iria mudar as nossas fraldas? alimentar pelo tubinho? Passar mais de 5 minutos connosco?

E é por isto que ás vezes caio em mim e penso que devemos dizer as pessoas tudo o que sentimos, devemos "aproveitá-las", saboreá-las na sua essência porque podem não morrer, mas podem deixar-nos sós na mesma não nos reconhecendo... saboreiem quem amam....

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